
O economista americano Thomas Sowell afirmou: "Não existem soluções, apenas compromissos." Esta ideia é particularmente relevante no contexto do trabalho híbrido em Portugal, uma realidade consolidada após a pandemia, que transformou a forma como trabalhamos. Empresas portuguesas enfrentam agora o desafio de equilibrar a autonomia do trabalho remoto com a necessidade de proximidade física, enquanto tentam aumentar a produtividade e promover o bem-estar dos seus colaboradores.
"Não existem soluções, apenas compromissos." Thomas Sowell
Neste artigo, exploramos como o trabalho híbrido está a impactar o mercado de trabalho português, destacando os principais desafios e oportunidades para empresas de diferentes setores e dimensões, desde pequenas e médias empresas (PMEs) a grandes multinacionais.
Em Portugal, as empresas enfrentam desafios significativos na implementação do trabalho híbrido. Algumas optaram pelo trabalho remoto completo, enquanto outras estão a adotar o Return to the Office (RTO), utilizando incentivos ou medidas obrigatórias. No entanto, a maioria das organizações está a tentar encontrar o equilíbrio certo entre o trabalho remoto e o presencial, um desafio contínuo desde 2022.
Trabalho Híbrido: Desafios, Benefícios e Como Encontrar o Equilíbrio
Em Portugal, tal como noutros países, o trabalho híbrido oferece benefícios difíceis de ignorar, e a maior parte das organizações continua à procura de uma solução equilibrada. Redução de custos operacionais, maior produtividade, diminuição do absentismo e retenção de talento são algumas das vantagens frequentemente mencionadas. O aumento da flexibilidade laboral tem também sido um fator decisivo para muitos profissionais que procuram equilibrar a vida pessoal e profissional, algo que, em última instância, aumenta o seu envolvimento e motivação profissionais.
É importante salientar que, enquanto a flexibilidade e a autonomia no trabalho são atrativas para os colaboradores, estas também podem acarretar desvantagens. Muitas organizações entendem agora que conceder demasiada autonomia aos seus colaboradores pode levar a uma fragmentação das equipas e a uma diluição da cultura organizacional. A vasta gama de preferências pessoais e os padrões de comportamento variáveis dos colaboradores aumentam a probabilidade de se enquadrarem em diferentes “rotações de presença”, resultando em encontros esporádicos ou, nalguns casos, nenhum encontro fora de reuniões programadas. A falta de contacto físico regular enfraquece a coesão entre os colaboradores, que é essencial para manter uma cultura de confiança e colaboração, fatores que adquirem uma importância fundamental nos novos regimes de trabalho.
A realidade do trabalho híbrido em Portugal
O equilíbrio entre o trabalho remoto e presencial é uma questão que afeta tanto pequenas e médias empresas (PMEs), que compõem a maior parte do tecido empresarial português, como grandes empresas multinacionais que também se encontram instaladas no nosso país. Várias organizações têm constatado que o modelo híbrido pode reduzir os custos operacionais, melhorar a produtividade e, simultaneamente, promover o bem-estar dos colaboradores. A redução do absentismo, menor rotatividade de pessoal e uma maior capacidade de atrair talento são alguns dos benefícios também apontados frequentemente em Portugal.
De acordo com o estudo "27.º CEO Survey – Portugal Insights" da PwC, os líderes empresariais em Portugal têm mostrado confiança na sustentabilidade dos seus negócios, com 73% dos CEO a acreditar que as suas empresas serão viáveis nos próximos 10 anos. Para muitos desses líderes, a utilização de regimes de trabalho híbridos faz parte desta equação de viabilidade a longo prazo, oferecendo às empresas uma forma de atrair talento sem os custos adicionais associados à constante presença física no escritório.
Benefícios do Trabalho Híbrido para Empresas em Lisboa e Porto
Nas áreas metropolitanas como as de Lisboa e Porto em especial, o modelo híbrido tem-se revelado vantajoso em termos de retenção de talento. A flexibilidade no trabalho torna-se um fator diferenciador num mercado competitivo, permitindo que as empresas portuguesas atraiam e mantenham profissionais qualificados, sobretudo em setores altamente competitivos como as tecnologias de informação e os serviços partilhados.
Por outro lado, a necessidade de contacto presencial é, em Portugal, especialmente relevante para setores que tradicionalmente dependem de relações pessoais, como a banca, os seguros e os serviços públicos. Nesse sentido, a reintrodução de políticas que exijam a presença no escritório tem sido uma realidade em algumas empresas portuguesas. No entanto, a popularidade do trabalho híbrido entre os colaboradores, especialmente nas novas gerações de trabalhadores, coloca desafios para estas políticas mais rígidas.
No respeitante às multinacionais instaladas em Portugal, apesar de genericamente mais liberais na implementação de regimes de trabalho flexível, começa também a verificar-se uma tendência para o RTO, com nuances variadas, desde a sugestão amigável ao enforcement.
Riscos de Fragmentação Cultural nas Organizações Portuguesas
A fragmentação das equipas e a diminuição da cultura organizacional tornam-se particularmente problemáticas nas organizações onde é essencial uma colaboração intensiva entre várias equipas, prejudicando a própria agilidade e inovação que estas organizações procuram cultivar, e que são áreas críticas para a competitividade empresarial em Portugal.
Adicionalmente, as relações interpessoais desempenham um papel significativo na dinâmica empresarial, o que torna este risco ainda mais real. O contacto pessoal regular é muitas vezes fundamental para a cultura empresarial portuguesa, caracterizada por um forte sentido de pertença e trabalho em equipa. A ausência de interações espontâneas entre equipas enfraquece a confiança e o espírito de camaradagem. Nas organizações portuguesas, onde a colaboração transversal é cada vez mais importante, especialmente em setores como o turismo, a indústria e os serviços, manter a coesão entre os colaboradores é essencial para o sucesso.
As empresas portuguesas, especialmente as que têm estruturas mais horizontais ou que dependem de uma forte colaboração entre equipas, enfrentam, por isso, o desafio acrescido de manter a coesão cultural e o trabalho de equipa num ambiente saudável de trabalho híbrido.
Políticas de Retorno ao Escritório e o Futuro do Trabalho Híbrido
Algumas empresas, em resposta a estes desafios, começaram a implementar políticas que obrigam os colaboradores a voltar ao escritório em tempo integral, ou, no mínimo, a incrementar os dias de presença física no escritório. No entanto, em Portugal, tal como noutros países, o trabalho híbrido continua a ser altamente valorizado pelos colaboradores, especialmente num mercado de trabalho competitivo, onde a flexibilidade é vista como um benefício essencial. Para as empresas que optam por políticas rígidas de presença, existe o risco real de perderem talentos para organizações concorrentes mais flexíveis, que oferecem melhores condições de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional.
As estatísticas existentes, sobretudo relativas ao mercado de trabalho norte americano, indicam que a implementação de regimes de trabalho flexível mantém a tendência para aumentar. Ao mesmo tempo, é inegável que uma enorme percentagem de trabalhadores deseja usufruir de um regime híbrido de trabalho, e que a sua inexistência leva a que os mais qualificados abandonem essas organizações ou não tenham qualquer interesse em juntar-se a elas, enquanto possuírem mais opções profissionais à disposição.
Do lado das organizações, é palpável o receio de que a implementação de uma política que obrigue ao regresso completo ao escritório resulte na perda dos seus talentos para empresas concorrentes, tanto em Portugal como no estrangeiro, que ofereçam maior flexibilidade.
O Trabalho Híbrido como um Jogo de Compromissos
Gerir o trabalho híbrido não deve ser visto como um jogo de soma zero, mas sim como uma estratégia de compromisso, que permite captar o melhor dos dois mundos. Contudo, a implementação de um modelo híbrido eficiente exige uma gestão equilibrada de inúmeras variáveis. A realidade em Portugal é que, para muitas organizações, a tomada de decisões neste contexto não é simples, especialmente à medida que as empresas se tornam maiores e mais complexas. muitas vezes lidando com recursos limitados e múltiplos interesses, o que exige uma gestão cuidadosa.
Neste contexto, seria uma oportunidade perdida assumir que uma boa tomada de decisão consiste em resolver dilemas fazendo escolhas óptimas. Ao contrário da matemática, onde existe uma única resposta correta, a tomada de decisões no mundo dos negócios assemelha-se muitas vezes à navegação em paradoxos - onde alternativas diferentes e muitas vezes opostas devem ser integradas numa estratégia dinâmica e abrangente.
Isto sublinha a ideia de que podem coexistir várias abordagens válidas e que o sucesso reside na harmonização destes caminhos aparentemente contraditórios. Como disse o guru do marketing Rory Sutherland, “o oposto de uma boa solução pode ser outra boa solução”.
E é na gestão do que apelidamos ‘Paradoxo Híbrido’, onde se tentam harmonizar duas tendências aparentemente contraditórias, a da autonomia e a da proximidade, desejadas respetivamente pelos colaboradores e pelas organizações, que surge o conceito de ‘Equilíbrio Dinâmico’.

Paradoxo Híbrido e o Equilibrio Dinâmico
O conceito de "Equilíbrio Dinâmico" descreve o ponto ideal entre a autonomia dos colaboradores e a proximidade física, onde a produtividade e a coesão organizacional estão otimizadas. No entanto, este ponto de equilíbrio é um alvo em constante movimento. As circunstâncias mudam constantemente, e as organizações precisam de ajustar as suas políticas de forma proativa para se conseguirem manter neste ponto de equilíbrio ao longo do tempo.
Gerir o Equilíbrio Dinâmico
O estado de Equilíbrio Dinâmico requer que as organizações tenham de se adaptar continuamente, de forma a conseguir manter alinhados os seus objetivos com as necessidades das partes interessadas, neste caso, as dos seus colaboradores. Para tal, é essencial que as organizações implementem dois tipos de mecanismos: monitorização da proximidade e avaliação da autonomia. Adicionalmente, existem oportunidades de melhoria para a grande maioria dos regimes de trabalho flexível em vigor, que permitem que este equilíbrio pode ser alcançado, se considerarmos os seguintes pontos:
- Organização Proactiva da Presença Em vez de um planeamento rígido do topo para a base, as empresas devem incentivar uma organização flexível e colaborativa de presenças no escritório, focando-se em momentos estratégicos de interação presencial das equipas para reforçar a coesão e a colaboração. O sucesso de um ambiente híbrido depende da capacidade dos colaboradores de se autogerirem dentro de valores e princípios partilhados. É importante que as organizações portuguesas promovam uma cultura de confiança, em que a responsabilidade e o compromisso são mutuamente acordados.
- Substituição de Regras Básicas por Princípios Orientadores As regras básicas do tipo ‘3 dias no escritório + 2 em casa’ não têm capacidade de acomodar as necessidades de todos os colaboradores, nem de todas as equipas, nem das próprias organizações, porque os requisitos de todos se vão alterando ao longo do tempo. São regras fáceis de compreender, de implementar e de impor, e por isso comuns. Mas em última instância podem prejudicar tanto uns como outros. Mais difícil, mas mais eficaz, é estabelecer um conjunto de princípios orientadores que cumpram o mesmo propósito: para além do número de dias fixo em que se exige a presença no escritório, existem dias de equipa, eventos específicos, períodos específicos do mês ou do ano em que se requer mais interação pessoal ou entre equipas, projetos específicos, e todos eles beneficiam da presença física de colaboradores e da interação entre estes.
- Definição de Limites Claros para a Autonomia A autonomia é benéfica, mas é necessário estabelecer limites claros que alinhem a flexibilidade dos colaboradores com os objetivos da organização. As equipas devem poder organizar o seu trabalho, mas dentro de parâmetros que garantam que os objetivos estratégicos são atingidos. Nesse sentido, os princípios orientadores de um regime de trabalho flexível devem explicitar de forma clara os limites existentes aplicáveis, mas mais importante, os casos em que a necessidade da organização prevalece sobre a autonomia do colaborador.
- Capacitação dos Líderes de Equipa As organizações atravessam, de uma forma geral, um momento de tendência para uma maior horizontalidade nas suas hierarquias internas. Ao mesmo tempo, os team leaders, que se situam hierarquicamente entre os colaboradores individuais e o middle management, são quem tem a melhor visão da dinâmica das equipas, encontrando-se numa posição chave para fazer a ponte entre os interesses individuais e coletivos. Os líderes de equipa desempenham por isso um papel crucial na gestão do trabalho híbrido, garantindo que as equipas permanecem coesas e produtivas. Capacitar os líderes de equipa para a organização da presença no escritório é uma medida essencial para a gestão do equilíbrio dinâmico.
- Fornecimento de Ferramentas Adequadas As empresas devem fornecer as ferramentas tecnológicas e de gestão adequadas para que os líderes de equipa e direções possam gerir eficazmente as suas equipas e a presença no escritório, assim como aos colaboradores para que possam gerir a sua autonomia, promovendo uma colaboração eficaz tanto a nível presencial como remoto.
- Implementação de Mecanismos de Avaliação de Satisfação dos Colaboradores É importante monitorizar de forma contínua a satisfação dos colaboradores, tanto quanto à tipologia de regime flexível em que se enquadram, como também às condições de trabalho que lhes são disponibilizadas no espaço do escritório. Guiar-se apenas pela percentagem de utilização do espaço físico ao longo de um período específico é uma forma fácil, mas incompleta, de extrair conclusões quanto à eficácia do regime de trabalho flexível e à produtividade dos colaboradores.
- Gestão da Informação A gestão do equilíbrio dinâmico e dos fatores de proximidade e de autonomia deve assentar em informação fidedigna, significativa e constantemente atualizada. Esta informação é disponibilizada pelas ferramentas de gestão das equipas disponibilizadas pela organização. Na posse desta informação, as empresas estão em condições de avaliar o sucesso da implementação das políticas de trabalho híbrido e tomar decisões estratégicas em harmonia com os seus objetivos.
- Flexibilidade do Espaço Físico Por último, mas não menos importante, as organizações têm de prevenir possíveis alterações nos seus espaços de trabalho, consoante se produzam alterações nos regimes de trabalho híbrido. Incrementar o regime existente com mais um dia de trabalho no escritório, por exemplo, terá fortes implicações na ocupação do espaço de trabalho, que tem de estar preparado para as absorver.
Conclusão: O Futuro do Trabalho Híbrido em Portugal
O trabalho híbrido, quando gerido de forma eficaz, representa uma oportunidade única para as empresas aumentarem a produtividade e reduzirem custos, enquanto oferecem maior flexibilidade aos seus colaboradores. No entanto, este modelo, quando implementado de forma simplista, apresenta desafios significativos, particularmente no que diz respeito à manutenção de uma cultura organizacional forte e coesa.
As oportunidades e desafios deste modelo devem ser permanentemente geridos com base em informação fidedigna e atualizada; as organizações têm de implementar mecanismos que lhes permitam saber em qualquer tempo onde se encontra o ponto de equilíbrio entre os seus interesses de proximidade e os de autonomia dos colaboradores.
As empresas que conseguirem gerir eficazmente o "Equilíbrio Dinâmico" serão aquelas que melhor conseguirão adaptar-se e prosperar nesta nova era do trabalho. A capacidade de implementar ferramentas que permitam definir de forma permanente o equilíbrio certo entre a autonomia e o controlo será cada vez mais uma competência essencial para as organizações em Portugal.
Está também a enfrentar estes desafios, ou já encontrou uma solução inteligente para os resolver? Informe-me escrevendo para: miguel.silva@procosgroup.com
Adaptado do artigo: “Making hybrid working work” de Richard Stoop - PROCOS Group
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